A Epopeia dos Preços dos Combustíveis no Brasil

A discussão da atual política de preços dos combustíveis no Brasil ganhou fôlego a partir da percepção que houve um descolamento entre o aumento dos preços dos combustíveis no mundo e o IPCA verificado no Brasil em 2021.

Assim, o barril do petróleo (Brent), negociado em Londres, subiu de US$ 54,55 em janeiro de 2021 para US$ 77,78 na última sessão de 2021, uma variação de 42,58%. O impacto da variação de preços do petróleo Brent no IPCA no Brasil foi imediato.

Com efeito, o IPCA, que é o índice oficial da inflação no Brasil, atingiu 10,06% em 2021, contra 4,5% em 2020. A inflação de 2021 é a maior taxa acumulada desde 2015 e reflete, principalmente, ‘inter alia’, a explosão dos preços dos combustíveis nos mercados internacionais, notadamente Londres, onde o petróleo Brent é comercializado. De fato, a inflação de 2021 foi impulsionada pelo aumento de 21,03% no grupo Transportes.

Especificamente a chamada inflação dos combustíveis no Brasil em 2021 foi ocasionada principalmente pelo diesel, o qual subiu 46,8%, pela gasolina, que acumulou alta de 46,5% e pelo etanol, que subiu de 62,23. O Gás Natural Veicular e o gás de cozinha não ficaram muito atrás, com aumentos de 40,1% e 35,8%, respectivamente. Para completar o cenário, a eletricidade subiu 21,21% em 2021, contribuindo com 0,98 ponto percentual no aumento de IPCA desse ano.

Ao mesmo tempo, o lucro recorde de R$ 106,6 bilhões da Petrobras em 2021 pegou de surpresa os contribuintes brasileiros, que ficaram assustados com a magnitude do lucro da petroleira de propriedade da União e com a sensação de que apenas eles – os contribuintes – estavam sendo chamados para pagar o preço da conta da inflação dos combustíveis. Além disso, os anúncios dos aumentos constantes dos combustíveis no Brasil pela Petrobrás passaram a impressão ao contribuinte brasileiro que a empresa havia se tornado insensível às necessidades da sociedade brasileira, que não apenas havia financiado a criação da empresa, mas a havia socorrido quando esta teve grandes perdas na década passada, em particular entre 2010 e 2016.

O fato do lucro da Petrobrás ter sido o maior já registrado por empresas de capital aberto no Brasil também não ajudou na imagem da petroleira a qual saiu bastante desgastada desse episódio.

Foi nesse contexto que a discussão sobre o aumento dos preços dos combustíveis chegou ao Congresso. Ficou clara a necessidade de se substituir uma política de paridade externa, como a PPI da Petrobrás, adotada em 01/06/2016, com a posse de Pedro Parente na presidência da empresa, por uma política mais centrada nos custos domésticos. Com efeito, no período em que os preços dos combustíveis no Brasil passaram a seguir os preços internacionais (a denominada política PPI (Preço de Paridade Internacional) o preço da gasolina e do diesel não pararam de subir. Apenas a titulo de ilustração, a gasolina em dezembro de 2016 podia ser comprada a R$ 3,7 enquanto em junho de 2022 já custava, em média, em torno de R$ 7,6, uma variação de 102% em 5 anos e meio para uma inflação , medida pelo IPCA, de cerca de 30% no mesmo período.

Como um primeiro resultado concreto da discussão sobre a necessidade de uma mudança da política de preços da Petrobrás foi aprovada a Lei Complementar no. 192 em março de 2022 (11/03/2022).

Segundo a Lei Complementar no. 192, o ICMS recairia uma única vez nas operações interestaduais com combustíveis, cabendo o imposto ao Estado de origem (art. 3º, inciso IV). A Lei estabelece ainda que o ICMS deveria ser uniforme e específicas (ad rem) e por unidade de medida (por exemplo: litro, galão ou m3).

As determinações acima terminaram com uma longa discussão sobre como deveriam ser cobrados os impostos (e, naturalmente a quem pertencem) obtidos a partir dos combustíveis, se aos Estados produtores (e, portanto, cobrado na origem) ou se aos Estados consumidores (e, consequentemente, cobrados no destino).

Além disso, a Lei Complementar no. 192 evitou o chamado “efeito cascata” ao impedir que os impostos (no caso, o ICMS) fossem cobrados várias vezes ao longo da cadeia produtiva em valor, aumentando seu preço até chegar ao consumidor final.

Mais recentemente, em junho de 2022, foi aprovado o Projeto de Lei Complementar nº 18/2022, do Dep. Danilo Forte (União-CE), o qual estabeleceu que os combustíveis e serviços associados a eles, tais como fornecimento e distribuição de gasolina, de óleo diesel e de álcool, energia elétrica, transporte coletivo e comunicações sejam considerados como “essenciais” e não supérfluos na legislação tributária de cada estado, o que automaticamente criaria um “teto” para o ICMS entre 17% e 18%.

A Lei Complementar 18/2022 seguiu uma decisão do Supremo Tribunal Federal de 24/11/2021 acerca da cobrança de ICMS sobre combustíveis, sobre energia elétrica e sobre serviços de telecomunicação, o qual estabelecia que o ICMS sobre tais itens não poderiam ser superior a 17% sob o risco de inconstitucionalidade. A decisão foi uma resposta ao Recurso Extraordinário (RE) 714.139. Este, como se sabe, teve repercussão geral, ou seja, tem validade em todo o país e não abrange apenas os autores do Recurso (Lojas Americanas S.A x Tribunal de Justiça de Santa Catarina), mas alcança a todos os Estados da Federação.

Como consequência dessas novas leis, os preços dos combustíveis já começaram a cair.

Com efeito, segundo a Agência Nacional de Petróleo, o preço da gasolina caiu, na média nacional, de cerca de 7,00 reais o litro (entre 26/06 e 2/07) para cerca de R$ 6,50 (entre 03/07 e 09/07) uma significativa queda 9%. Ou seja, foram precisas duas leis para tentar conter os lucros da Petrobrás e acalmar a ânsia arrecadatória dos Estados da Federação brasileira.

 

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